O CÉREBRO DO
ADOLESCENTE
Dra. Saada
Ellovitch*
Todos sabemos que a
adolescência é um período de grandes transformações físicas e emocionais
próprias do desenvolvimento do corpo e do cérebro. Este período é caracterizado
por decisões sub-ótimas e ações associadas ao aumento de possíveis
comportamentos não intencionais, com consequências muitas vezes para o resto da
vida do indivíduo e sua família: envolvimento em acidentes, violência, exposição
ao uso de drogas lícitas e ilícitas, gestação indesejada e doença sexualmente
transmissível.
Gastam a maior
parte do tempo com seus pares, outros adolescentes, fisicamente ou virtualmente,
ficando menos tempo com adultos. Apresentam frequentes conflitos com os
pais.
O alicerce do
desenvolvimento cognitivo é a habilidade de suprimir pensamentos e atos
inapropriados a favor de ações direcionadas a metas, especialmente na presença
de incentivos irresistíveis. Isso significa que um bom investimento futuro é
desenvolver desde a infância, desde a pré escola, a tolerar frustrações,
controlando impulsos e adiar recompensas. Pois é, “engolir sapos” e não ganhar
tudo que quer, faz parte do treinamento.
Existem muitos
mitos sobre o funcionamento do cérebro do adolescente, que os avanços da
neurociência e principalmente da neuroimagem funcional têm recentemente sido
esclarecidos.
Busca pelo prazer
imediato
Ressalto que o
adolescente apresenta como característica comportamento de maior exposição ao
risco, grande reatividade emocional e menor planejamento e controle de suas
ações. O conhecimento da neurociência atual comprova o que a experiência de
nossos antepassados já conhecia na prática.
Na adolescência,
primeiro se desenvolve, ou amadurecem as áreas responsáveis pela emoção. Isso
está associado a diferentes trajetórias do desenvolvimento de regiões límbicas
subcorticais nesta idade (áreas da emoção). Caminhando para o final da
adolescência e idade adulta ocorre progressiva mudança de controle para a região
cortical, mais precisamente o córtex pré-frontal (área da razão), responsável
pelo controle cognitivo e funções executivas. Corresponde a desenvolver
planejamento e execução de seus atos em direção a cumprir
metas.
Até ratos e
chimpanzés adolescentes se arriscam mais e vivem à caça de novidades e
prazeres.
O controle do
cérebro do adolescente vai de baixo para cima, das regiões subcorticais para o
córtex: prazer aqui e agora, custe o que custar. O adolescente não antevê
consequências, mas não podemos dizer que não tenham fé. Sempre acham que suas
atitudes intempestivas vão dar certo.
Dizer para o
adolescente estudar, para ter um emprego melhor no futuro ou mesmo estudar
diariamente para chegar no final do ano e passar de ano para ganhar computador
novo, fica difícil de ser atingido. Eles precisam ter a recompensa rápida. Seu
cérebro é movido pelo aqui e agora. Prazer já! Mais gostoso ficar no
iPad.
O controle do
adulto “maduro” acontece de cima para baixo, do córtex pré-frontal, responsável
pela razão, predominando sobre as regiões subcorticais, da emoção.
Progressivamente ocorre amadurecimento no sentido de desenvolver maior
eficiência no controle cognitivo, com melhores tomadas de decisões e modulação
do afeto.
Recompensas por
méritos
Fica mais efetivo
descobrirmos seu maior prazer, que geralmente são o acesso às “telas”: tablets,
iPhone, computador e TV, para fazermos acordos de oferecer recompensas por
merecimentos, em vez de castigos. Alguns vão “morar no castigo”. Podemos fazer
propostas claras e imediatas: se cumprir os combinados (agenda completa, revisão
de conteúdo, lição, cooperação familiar mínima, habilidade social) poderá
acessar as almejadas telas. Se não cumprir, não terá acesso a telas neste
período.
Claro que isso poderá ser acompanhado de explosão de sentimentos de raiva, com crises de birra, por vezes xingamentos, atirar objetos, ameaça de abandonar seu amor, ou choro. Os sentimentos todos podem e devem ser acolhidos com compreensão, mas imediatamente posicionados: “entendemos sua raiva de precisar adiar os prazeres e precisar cumprir os deveres, porém não aceitamos que jogue os objetos no chão ou que expresse palavras inadequadas”.
Claro que isso poderá ser acompanhado de explosão de sentimentos de raiva, com crises de birra, por vezes xingamentos, atirar objetos, ameaça de abandonar seu amor, ou choro. Os sentimentos todos podem e devem ser acolhidos com compreensão, mas imediatamente posicionados: “entendemos sua raiva de precisar adiar os prazeres e precisar cumprir os deveres, porém não aceitamos que jogue os objetos no chão ou que expresse palavras inadequadas”.
Comportamentos são
controlados por consequências imediatas:
se...então...
Uma vez que o
comportamento tenha ocorrido, não poderá mais ser alterado. Já foi, já
aconteceu, porém, as consequências imediatas que se seguem alteram a
probabilidade desse comportamento vir a acontecer novamente, ou não.
As terapeutas
comportamentais usam a expressão “se...então...” para resumir esta condição. Se
colocar dedo na tomada, então leva choque. Se ultrapassar o limite da bagunça na
classe, então não participará do recreio... Portanto, uma ação ou um
comportamento executado, será reforçado, quando seguido de uma consequência
imediata: AÇÃO, CONSEQUÊNCIA, REFORÇADOR (estímulo).
O indivíduo precisa
vivenciar as consequências de seus atos. Isso ocorrendo de forma repetida leva
ao aprendizado. As consequências imediatas passam a controlam a ação ou
comportamento futuro do indivíduo.
Há uma frase que
cabe bem na educação e formação dos nossos filhos, alunos, pacientes, enfim
cidadãos, cujo autor parece ter sido Darwin que diz “Não é o mais forte que
sobrevive, nem o mais inteligente, mas o que melhor se adapta às mudanças do
ambiente”.
Comportamento certo
no lugar certo, maior probabilidade de sucesso.
Colocar limites
claros, regras claras, fazer acordos
Estabelecer limites
esclarece ao indivíduo o que pode, o que não pode e até onde
pode.
Na adolescência há
necessidade de fazer acordos. Há necessidade de ouvi-los para fechar os
combinados. Não resolve apenas determinar nesta faixa
etária.
As regras e limites
devem ser colocados antecipadamente. Devem ser falados e, se possível, escritos
e colocados em local visível. Devem ser usadas poucas palavras, de forma breve,
firme e claras. Sem discurso de Fidel. Se necessário use sinônimos para não
ficar dúvidas. Nada é óbvio: tudo precisa ser verbalizado, nada deve ser
subentendido. Faça breve questionamento para verificar se compreendeu
claramente. Depois disso tudo, só resta assumir a consequência imediata e a
frase: “que parte do não pode..., se não... ou do se...então ... você não
entendeu?”
Se você não colocar
limites, a sociedade o fará, porém não com tanta tolerância, compreensão e
carinho. Como nada é óbvio, esclareço que não adianta colocar limites se eles
não forem respeitados. Aprender a seguir regras e respeitar limites depende das
consequências apropriadas que o indivíduo sofre.
Agir com
consistência não significa não
Pais e cuidadores
devem agir sempre da mesma maneira quando a criança ou o adolescente apresentar
determinado comportamento. Não dá para dizer normalmente não pode, mas como hoje
o pai está cansado, então pode.
Muitos pais dizem
um “não” que significa “talvez” ou “não, mas tenho tanto dó de você”, ou muito
peso na consciência pois trabalham muito e ficam pouco com o filho... porque
você era tão fraquinho quando pequeno, quase não comia, é hiperativo, tinha
asma, etc. “A sociedade inteira quer que eu diga não, mas eu acho que você já
sofreu o suficiente...”.
Motivação e
recompensa liberam neurotransmissores no cérebro
Os comportamentos
adequados devem ser reforçados positivamente. Oferecer uma manifestação de
afeto, um elogio sincero, o reconhecimento do esforço, um presentinho, enfim,
uma consequência reconhecida como recompensadora para si
próprio.
Existem famílias
que não reforçam positivamente e ignoram cumprimentos de metas. O jovem se
esforça, se comporta bem, obtendo o melhor resultado possível e não há qualquer
manifestação de reconhecimento ou vem aquele comentário “não fez mais que a
obrigação”.
O processo de
neurodesenvolvimento é longo, se estendendo na maioria dos casos até por volta
dos 23 anos de idade. Há algumas sutilezas de refinamento de tomadas de decisão
que em alguns indivíduos acaba por volta dos 30 anos.
A maioria, por
volta dos 20 anos, já apresenta adequada maturidade neurológica. Claro que
desde o início da adolescência vai havendo progressiva autonomia. Caso haja
algum tipo de disfunção do sistema nervoso, pode haver necessidade de
gerenciamento próximo até o final do
neurodesenvolvimento.
*Dra. Saada
Ellovitch é neurologista da Infância e Adolescência do Hospital Samaritano de
São Paulo
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