terça-feira, 23 de julho de 2013

São Paulo de luto em defesa dos cidadãos, da medicina e da saúde


São Paulo de luto em defesa dos cidadãos, da medicina e da saúde


Os médicos de todo o estado de São Paulo declaram-se em luto no dia de hoje. O protesto é parte de um grito de basta nacional, que envolve profissionais de medicina, pacientes, entidades plurais da sociedade civil, enfim, o conjunto da comunidade paulista e brasileira.

Estamos em luto pelo risco iminente de falência múltipla dos órgãos da saúde pública do país. O Sistema Único de Saúde, nesse exato instante, é obrigado pelo Governo Federal a ingerir um remédio letal, batizado de programa Mais Médicos.

Manipulado irresponsavelmente com doses de princípios ativos venenosos, como o autoritarismo, o oportunismo eleitoral, a gestão ineficiente e a falta de compromisso social, o programa Mais Médicos, apresentado na forma de Medida Provisória 621/2013, é o mais contundente ataque já registrado no Brasil contra a saúde pública e a prática de uma medicina segura, de qualidade.

O Conselho Regional da Medicina do Estado de São Paulo, a Associação Paulista de Medicina, os Sindicatos de Médicos listam, a seguir, alguns pontos do projeto, que caracterizam oportunismo, autoritarismo e a falta de capacidade de responder aos problemas sociais na área da saúde.

  1. A Medida Provisória 621/2013 foi impetrada de cima para baixo, sem debate com a comunidade, com o meio acadêmico (incluindo aqui universidades de referência como a Faculdade de Medicina da USP, Unicamp, Escola Paulista de Medicina-Unifesp, entre outras), com as entidades médicas. Provoca alterações inconsequentes na formação de médicos e na prática da medicina, sem ouvir opiniões balizadas, caracterizando profundo desprezo aos princípios do Estado de Direito e à Democracia;

  1. Trata-se de uma proposta puramente midiática e oportunista, para inibir os protestos de rua por uma saúde de qualidade, tendo em vista que parte de seu “mérito” só entraria em vigor a partir de 2015, portanto após as eleições de 2014. A equivocada extensão dos cursos de medicina em dois anos, só colocará as primeiras turmas na assistência aos cidadãos em 2021;

  1. O governo alega falta de médicos em periferias das grandes cidades e em regiões remotas, mas, incoerentemente, atrasa a graduação e a formação de especialistas em dois anos, postergando a entrada dos mesmos na linha de frente da assistência;

  1. Cria o serviço civil obrigatório, forçando todo e qualquer estudante de medicina a trabalhar no SUS dois anos, mesmo que essa não seja sua vocação ou intenção, afrontando assim a Constituição Federal, que garante a quaisquer cidadãos os direitos de ir e vir, de pensar, de se expressar, de professar sua religião livremente, de escolher sua profissão e onde quer trabalhar, por exemplo;

  1. Abre a possibilidade de milhares de médicos formados fora do Brasil entrarem no sistema de saúde sem se submeter a um exame para comprovar a qualificação, sendo perigo potencial aos pacientes. Expõe, sobretudo, a parcela mais vulnerável e carente, pois é ela quem de fato estará entregue a profissionais de formação duvidosa.

  1. Ignora que os problemas de assistência em áreas remotas e periferias não se resolvem somente com profissionais de medicina. Somos médicos, não fazemos milagres. É impossível assistir adequadamente aos cidadãos, sem ter reagente para um exame de laboratório, ou um tomógrafo confirmar um diagnóstico, ou um raio-X, ou um aparelho para auscultar um feto, ou sem ter enfermagem, sem ter cirurgião-dentista, sem outros profissionais da área da saúde, sem assistente social, sem acesso a um hemograma, sem maca...;

  1. Sobre a falta de estrutura para atendimento, que fique registrado que não é exclusividade das regiões remotas. No Distrito Federal, com 4,09 médicos por mil habitantes (média quase duas vezes maior a de certos países europeus), não havia remédio para cólicas, fio cirúrgico para cesariana, entre outras calamidades apontadas por médicos, pacientes e pela imprensa;

  1. Diz o governo ter se inspirado na Inglaterra para conceber o Programa Mais Médicos. O paradoxo é que a Inglaterra possui um sistema de saúde exclusivo e investe 10% de seu Produto Interno Bruto nele. No Brasil, são investidos apenas 3,5% do PIB.

  1. Lembramos que as fronteiras do País sempre estiveram abertas a médicos de todas as nações. A Associação Paulista de Medicina, Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, Sindicato dos Médicos de São Paulo, Academia de Medicina de São Paulo, e diversas instituições da sociedade civil (veja lista completa abaixo**) já exteriorizaram em manifesto datado de 25 de maio que são favoráveis à entrada de todos os médicos formados no exterior por meio do "Revalida", desde que a avaliação seja mantida dentro dos critérios e padrões atuais. É um risco usar do expediente de flexibilizar este exame para facilitar a entrada de médicos estrangeiros e mesmo de brasileiros formados no exterior.

Pontuadas nossas principais críticas ao pacote do governo, apresentamos propostas simples para reverter o caos da saúde. Como solução para o problema da falta de profissionais de saúde em áreas remotas, pedimos especial empenho do Executivo para a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 454/2009, que cria a carreira médica no serviço público, semelhante à de juízes e promotores.

Que fique registrado, contudo, que a resolução do problema do atendimento integral não depende somente da melhor distribuição geográfica de médicos, mas também de estrutura adequada à assistência. Atualmente, repetimos, o SUS enfrenta um grave subfinanciamento e também distorções no processo de gestão. Por consequência, pleiteamos o aumento da destinação de verbas federais para 10% da Receita Bruta, e a criação de mecanismos adequados à fiscalização da gestão.

Desde já, exaltamos os presidentes do Senado Federal, Renan Calheiros, e da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves, assim como a todos os parlamentares do Congresso a derrubar a Medida Provisória do Programa Mais Médicos. Também conclamamos a população a entrar em contato com os deputados e senadores e deputados que elegeram, cobrando uma posição firme contra a MP e em defesa da saúde dos brasileiros.

São Paulo, 23 de julho de 2012

Associação Paulista de Medicina
Conselho Regional de Medicina
Sindicatos de Médicos de São Paulo


** Instituições signatárias da Carta aos Brasileiros, de 25 de maio de 2013
Associação Paulista de Medicina
Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo
Academia de Medicina de São Paulo
Sindicato dos Médicos do Estado de São Paulo
Associação Brasileira de Cirurgiões-Dentistas
Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional

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