* Lirismar Campelo
Foi
apresentada pelo Deputado Nazareno Fonteles, do Partido dos Trabalhadores (PT)
do estado do Piauí, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC)
nº 33, de 2.011, que dentre outras matérias, visa
submeter ao Congresso Nacional decisões do Supremo Tribunal Federal sobre
inconstitucionalidade de emendas à Constituição da República Federativa do
Brasil.
A PEC 33 causou grande perplexidade
no meio jurídico e no político. Os jornais noticiam manifestações de
desaprovação, especialmente por parte de Ministros do Supremo Tribunal Federal.
Gilmar Mendes, inclusive, disse que se a PEC 33 for aprovada, seria melhor
fechar a Suprema Corte.
Este é um momento que o Brasil
demonstraria maior maturidade institucional, por óbvio, com o regular
funcionamento das instituições. Mas não é o que está acontecendo. Com a aparente
“crise” com o Judiciário, vieram os encontros privados, inclusive na residência
de Ministros do STF, com os Presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado
Federal. Decerto que reuniões particulares não fazem parte da sistemática
prevista pela Constituição para resolução de eventuais “confrontos” entre os
Poderes da República.
A solução para o caso é muito mais
simples do que aparenta. Basta que as instituições observem o disposto pela
própria Constituição e os princípios que embasam o ordenamento jurídico, tal
como é (ou deveria ser) aprendido em qualquer curso jurídico, na disciplina
Introdução ao Estudo do Direito ou, oxalá, em Direito Constitucional
I.
Assim determina a PEC 33: “Artigo 3º.
O art. 102 da Constituição Federal de 1988 passará a vigorar acrescido dos
seguintes parágrafos: “Art. 102. ... § 2º-A - As decisões definitivas de mérito
proferidas pelo Supremo Tribunal Federal nas ações diretas de
inconstitucionalidade que declarem a inconstitucionalidade material de emendas à
Constituição Federal não produzem imediato efeito vinculante e eficácia contra
todos, e serão encaminhados à apreciação do Congresso Nacional que,
manifestando-se contrariamente à decisão judicial, deverá submeter a
controvérsia à consulta popular. §2º-B - A manifestação do Congresso Nacional
sobre a decisão judicial a que se refere o §2º-A deverá ocorrer em sessão
conjunta, por três quintos de seus membros, no prazo de noventa dias, ao fim do
qual, se não concluída a votação, prevalecerá a decisão do Supremo Tribunal
Federal, com efeito vinculante e eficácia contra todos. §2º-C – É vedada, em
qualquer hipótese, a suspensão da eficácia de Emenda à Constituição por medida
cautelar pelo Supremo Tribunal Federal”.
O texto da PEC 33 impede o efeito
imediato e vinculativo a todos de decisão do STF que declare a
inconstitucionalidade material (em outros termos, inconstitucionalidade do teor
da Emenda constitucional) de emendas à Constituição Federal.
Mas, afinal, quando uma norma é
inconstitucional? Chega a ser intuitiva, inclusive para os leigos (presume-se
que estes sejam os que não cursaram graduação em Direito), a noção de que uma
lei é inconstitucional quando o seu enunciado contraria o que dispõe o texto
constitucional. Este fenômeno só é possível porque todas as normas jurídicas são
hierarquicamente inferiores à Constituição Federal, devendo todas ser conformes
ao disposto em patamar constitucional.
No caso de uma Emenda constitucional,
o seu texto não é inferior à Constituição, tendo em vista que visa alteração da
própria Carta Magna. Como poderia alterá-la se fosse inferior a ela? O enunciado
de uma emenda, após sua aprovação, passa a fazer parte integrante do ápice do
ordenamento jurídico, em situação de igualdade hierárquica com todas as outras
normas constitucionais.
Assim sendo, hodiernamente já não
pode, em hipótese alguma, do ponto de vista lógico-jurídico, o Supremo Tribunal
Federal declarar a inconstitucionalidade material de uma Emenda à Constituição.
Quanto às emendas, em seu processo legislativo, assim
determina a Constituição: “Art. 60 – (...) § 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de
emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado; II - o voto direto,
secreto, universal e periódico; III - a separação dos Poderes; IV - os direitos
e garantias individuais”.
Quando o processo legislativo de
feitura de uma norma jurídica não se dá em conformidade ao disposto pela
Constituição, tem-se a situação de “inconstitucionalidade formal”, podendo,
portanto, a norma inquinada de tal nulidade ser declarada como não integrante do
ordenamento jurídico no âmbito de ações diretas de
inconstitucionalidade.
Em que pese a impossibilidade, por
razão lógico-jurídica, de uma emenda à Constituição ser declarada materialmente
inconstitucional, poderá a mesma ser declarada formalmente inconstitucional, se
decorrente de processo legislativo no qual tenha havido deliberação de emenda
tendente a abolir a forma federativa de Estado; o voto direto, secreto,
universal e periódico; a separação dos Poderes e os direitos e garantias
individuais.
Desta forma, por tratar única e
exclusivamente de inconstitucionalidade material, e não formal, de emenda à
Constituição, a PEC 33, ainda que aprovada, em relação à constitucionalidade de
emendas seria inócua. Ainda assim, poderá a emenda resultante da PEC 33 ser
declarada formalmente inconstitucional por, hipoteticamente, ter sido decorrente
de processo legislativo decorrente de deliberação de emenda tendente a abolir a
separação dos poderes, o que é vedado pelo art. 60, §4º, inciso III, da
Constituição da República Federativa do Brasil.
* Lirismar Campelo é especialista em
direito administrativo do Vieira e Pessanha Advogados
Associados.
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